domingo, 12 de junho de 2022

Já convivi o suficiente com coisas vivas pra perceber que ficamos quietos antes de morrer


Reparando o comportamento de lagartixinhas que aparecem no meu banheiro observei que elas se preparam pra morrer. Ficam quietas. Paradinhas no mesmo canto. Mal se movimentam, não importa o que você faça. Parece uma preparação intuitiva, de quem entende a ordem natural das coisas e é sábio o suficiente pra não resistir.


A vida vai se esvaindo pouco a pouco até não existir mais.
E elas deixam.

Nos ciclos de vida-morte-vida é natural ficar parado antes de morrer. O corpo pede, a alma sabe.
A necessidade de quietude antecede a morte, os momentos de transformação. A gente precisa de descanso. De presença. Acontece quando a gente menstrua, quando a lua míngua, quando chega o outono, um mês antes do nosso aniversário...

E se ficar parado antecede a morte, ficar parado é pulsão de morte. Porque a vida é movimento, uma dança entre controle e entrega, ou, como a definição de música mais conhecida: combinação de sons e silêncio.

Não dá pra morrer e continuar vivendo ao mesmo tempo, mas é preciso morrer pra continuar vivendo.

E eu escrevo tanto sobre isso, escrevo até as mesmas coisas. A cada dia acho que internalizo um pouco mais do que teoricamente eu já sei. Deixo de apenas saber, e passo a entender, num nível interno e pessoal de quem não apenas leu e ouviu sobre, mas também ritualizou, viveu e integrou.

Lembro de uma palestra da professora e filósofa Lucia Helena Galvão, onde ela cita outro filósofo cujo nome não me lembro, mas me recordo do que ele dizia: qualquer homem solto na natureza, em algum momento, começa a observar os movimentos da vida selvagem e, a partir deles, deduzir leis. Deduz também a existência de um divino, algo maior, transcendental, mais poderoso. Então, ele olha para si, e percebe que as leis naturais também se aplicam a ele.
Eventualmente, e numa progressão bastante lógica, ele compreende que entre ele, o divino e a natureza, não existe qualquer diferença.

Nenhum comentário

Postar um comentário

© buy on itunes
Maira Gall